A urgência de olhar para a Matemática no PNE

As evidências nacionais e internacionais não deixam dúvidas que a Matemática é hoje um dos nossos maiores desafios educacionais

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Artigo originalmente publicado no jornal Valor Econômico

Por Beatriz Alqueres – gerente-executiva de Advocacy do Instituto Ayrton Senna e Ernesto Faria – diretor executivo do Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede)

Em debate na Câmara dos Deputados, o texto do Plano Nacional da Educação (PNE),que estabelece metas e estratégias que devem guiar as políticas educacionais do Brasil até 2034, tem uma ausência preocupante: a falta de menção à aprendizagem de Matemática na Educação Básica. O único registro encontra-se no objetivo 13, relacionado ao Ensino Superior e às carreiras na área das exatas.

Dados os enormes desafios que o Brasil enfrenta na área, com apenas 5% dos estudantes da rede pública concluindo o 3º ano do Ensino Médio com aprendizado adequado na disciplina, esta é uma grave omissão. Afinal, a aprendizagem de Matemática ao longo da Educação Básica não está relacionada apenas ao sucesso escolar, mas à aquisição de habilidades fundamentais para a vida.

Ainda pouco falamos sobre isso, mas a Matemática está presente no dia a dia de todos, na resolução de problemas, tomada de decisões financeiras, participação democrática e combate à desinformação. É base para inúmeras carreiras e porta de entrada para a inovação e tecnologia. Restringir a aprendizagem em Matemática é limitar o indivíduo e suas possibilidades.

Matemática e PNE

Sendo a aprendizagem de Matemática essencial e a nossa dificuldade para garanti-la nas escolas amplamente conhecida, essa deveria ser uma pauta urgente. Os dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) de 2023 indicam 43,5% dos estudantes do 5º ano e 16,5% dos estudantes do 9º ano, da rede pública, com aprendizado adequado na disciplina, conforme parâmetro estabelecido pelo Todos pela Educação. As avaliações internacionais corroboram este cenário, apontando uma dificuldade maior em Matemática em comparação às outras disciplinas: pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA, na sigla em inglês) 2022, o país tem 10% dos estudantes atingindo pelo menos o nível 3 em Matemática; 19,2%em Ciências; e 24,3% em Leitura. O Estudo Internacional de Tendências em Matemática e Ciências (TIMSS) 2023 indica 21% dos estudantes com aprendizado pelo menos no nível intermediário na disciplina, no 4º ano. Em Ciências, o percentual é de 31%.

Esses resultados também evidenciam profundas desigualdades educacionais nessa área: estudantes de contextos socioeconômicos mais vulneráveis apresentam, em média, um atraso equivalente a dois anos escolares em relação aos colegas de grupos mais favorecidos. No PISA, por exemplo, enquanto um terço dos estudantes de alto nível socioeconômico têm aprendizado adequado na disciplina (na interpretação do Iede, aqueles que alcançam pelo menos o nível 3), entre os debaixo NSE são 3,1%.

As evidências – nacionais e internacionais – não deixam dúvidas que a Matemática é hoje um dos nossos maiores desafios educacionais, com impactos diretos sobre a equidade, a empregabilidade e a capacidade de inovação científica e tecnológica nacional. Aprender Matemática com qualidade é um direito dos estudantes e um importante passo para sua inclusão social, além de ser elemento essencial para o desenvolvimento socioeconômico do país.

Há diversos objetivos do Plano Nacional de Educação que poderiam incluir menções diretas ao ensino de Matemática, de forma a garantir que a disciplina receba a atenção necessária nas políticas educacionais. O Instituto Ayrton Senna e o Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede) elaboraram um documento com sugestões para a reformulação de algumas metas e estratégias de modo a garantir que o PNE evidencie a importância do ensino de Matemática nos próximos dez anos.

O Objetivo 3, que trata de Alfabetização, por exemplo, poderia mencionar o desenvolvimento das competências matemáticas iniciais, assegurando abordagens integradas entre linguagem e matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Afinal, o desenvolvimento de competências matemáticas nos primeiros anos de escolaridade é determinante para o sucesso escolar das etapas seguintes.

O Objetivo 5, que trata da aprendizagem no Ensino Fundamental e Médio, propõe metas de percentuais de aprendizado adequado gerais para as três etapas avaliadas no Saeb. No entanto, seria importante acompanhar o desempenho dos alunos em cada disciplina, pois elas não apresentam resultados homogêneos e Matemática, em particular, que tem dados muito críticos, poderia se beneficiar muito de um acompanhamento específico de seus dados de aprendizagem.

Também é importante garantir a equidade desse aprendizado, já que os dados do Saeb revelam que, na média, estudantes indígenas, quilombolas e do campo têm menores taxas de aprendizado adequado em Matemática. Uma opção seria abordar entre as estratégias do Objetivo 8, voltado para a inclusão desses estudantes, o desenvolvimento de políticas específicas para o fortalecimento da disciplina entre esses grupos, respeitando, é claro, suas especificidades linguísticas, culturais e territoriais.

É imprescindível, portanto, que o novo Plano Nacional de Educação incorpore metas e estratégias específicas para a aprendizagem Matemática na Educação Básica, com acompanhamento sistemático de resultados, estratégias para a recomposição das aprendizagens e ações estruturantes de formação inicial e continuada de professores.

Também é preciso implementar práticas pedagógicas inovadoras baseadas em evidências, além de construir políticas de equidade, com ênfase no combate às desigualdades de aprendizagem por cor/raça, gênero, território e condição socioeconômica. O Plano segue em debate no Congresso e é essencial que educadores, entidades e sociedade civil se mobilizem para fazer com que a Matemática receba a atenção que merece nesta lei.

O fortalecimento da Matemática na Educação Básica é indispensável para que o Brasil avance na garantia do direito à educação de qualidade, promova a equidade e prepare suas novas gerações para os desafios do século 21. Sem ela, não poderemos, de fato, alcançar o desenvolvimento sustentável e criar mais oportunidades para todos.

Instituto Ayrton Senna
Instituto Ayrton Senna Organização sem fins lucrativos comprometida com a educação

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