"Vai precisar, em primeiro lugar, ter habilidade para unir o país em torno de um mesmo ideal: fortalecer a democracia e as diferentes instâncias de poder, saber governar com as diferenças e promover o desenvolvimento social e econômico, para que o país possa novamente voltar a crescer de forma sustentável" por Mozart Neves Ramos para o Correio Braziliense.
Por Mozart Neves Ramos
(Opinião – Correio Braziliense – 01/11/2018)
Jair Bolsonaro, neste último domingo, foi eleito para governar o Brasil nos próximos quatro anos. Vai precisar, em primeiro lugar, ter habilidade para unir o país em torno de um mesmo ideal: fortalecer a democracia e as diferentes instâncias de poder, saber governar com as diferenças e promover o desenvolvimento social e econômico, para que o país possa novamente voltar a crescer de forma sustentável. Isso significa reduzir o hiato que separa o nosso Produto Interno Bruto (PIB) do nosso Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). O Brasil tem o 9º PIB mundial, com 2,056 trilhões de dólares – mas, em 2011, o PIB brasileiro era de 2,616 trilhões de dólares. Por outro lado, o país ocupa a 79ª posição no ranking mundial do IDH, que depende fortemente do vetor educação.
Dentre os 45 países que respondem por 85% do PIB mundial, o Brasil ocupa, em termos de crescimento do PIB, a última posição. Para o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, o crescimento de 1% em 2017 ainda é insuficiente para alterar o quadro econômico instalado no país após a crise doméstica vivida entre 2014 e 2016, período em que o Brasil retroagiu, segundo ele, 7,2% em termos acumulados e gerou elevado déficit fiscal (primário e nominal), aumento desenfreado do desemprego, estagnação da renda real, paralisia nos investimentos e perda ainda maior de competitividade no setor fabril.
Voltar a crescer significa fazer as reformas, retomar a confiança dos investidores e desenvolver uma política consistente de oferta educacional associada ao binômio emprego e renda. Quero aqui me referir especificamente a este último tópico – educação, emprego e renda – e ao enorme desafio que isso representa para o presidente eleito Jair Bolsonaro. O país tem 1 milhão de jovens de 15 a 17 anos, que deveriam estar na escola frequentando o Ensino Médio, que nem estudam nem trabalham – a chamada geração “nem-nem”. Se ampliarmos a faixa etária para 15 a 29 anos, esse número chega aos 11 milhões de jovens nessa condição – o que equivale a três países do tamanho do Uruguai!
Junta-se a esse cenário o fato de o país ter atualmente cerca de 4,8 milhões de pessoas na condição de desalentados (pessoas que desistem de procurar trabalho após ficarem muito tempo desempregadas) e de que falta trabalho para 27,6 milhões de brasileiros, como mostra a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A taxa de subutilização da força de trabalho ficou em 24,6 % no segundo trimestre de 2018.
O resultado de tudo isso tem sido, entre outras coisas, a explosão da violência em todo o país. Os homicídios, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), equivalem à queda de um Boieng 737 lotado diariamente. Representam quase 10% do total das mortes no Brasil e atingem principalmente os homens jovens: 56,5% de óbitos dos brasileiros entre 15 e 19 anos foram por morte violenta.
Reverter esse quadro passa necessariamente pela educação – não só por ela, mas sem ela não chegaremos lá –, na perspectiva de um alinhamento entre crescimento econômico e social. Infelizmente, o Brasil oferece uma educação de baixíssima qualidade, a começar pela alfabetização de nossas crianças: 55% delas não sabem ler, escrever e contar adequadamente ao final do 3º ano do Ensino Fundamental, quando a maioria já está com 9 anos de idade! Não se pode deixar de reconhecer que o Brasil melhorou quanto ao acesso à escola – mas sem qualidade. É preciso colocar nessa mesma equação da educação quantidade e qualidade. Como se diz popularmente, vamos precisar mudar o pneu com o carro em movimento. Isso porque a larga maioria dos países já está se preparando para enfrentar a chamada revolução industrial 4.0, e nós ainda estamos patinando com o analfabetismo de nossas crianças.
O Brasil precisará fazer um esforço hercúleo, nos próximos anos, no campo da educação, mas não há outro caminho. Há cinquenta anos o papa Paulo VI, em uma das encíclicas mais importantes da doutrina social da Igreja Católica, a Populorum Progressio (O Desenvolvimento dos Povos), afirmou: “A paz é o novo nome do desenvolvimento”. Esse desenvolvimento passa tanto por uma educação formal de qualidade – para aqueles que estão na escola – como pela oferta de uma educação não formal – para aqueles que deixaram de sonhar com uma vida próspera. A formal é estruturante para o país no médio e no longo prazo, mas a não formal é urgente para ampliar as chances de empregabilidade e renda. Isso vai exigir um esforço de conexão entre as áreas da educação, do trabalho e do desenvolvimento social do próximo governo, com articulação política da própria presidência da república através da Casa Civil. O país tem uma bomba social de efeito retardado gravíssimo. Precisamos impedir que ela exploda em nossa casa.
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