Por Mozart Neves Ramos
(Correio Braziliense ‐ Opinião ‐ 07/05/2015)
Espera‐se que até junho estados e municípios brasileiros concluam os respectivos planos de educação. Um trabalho que não é simples, considerando o atual momento político e econômico do país. Mas isso não pode servir de desculpa. Afinal, trata‐se de planos que estabelecem diretrizes da educação para os próximos 10 anos. Espera‐se também que não sejam planos meramente burocráticos, mas inovadores e criativos, capazes de dialogar com os desafios do século 21. Entretanto, tenho pelo menos duas grandes preocupações.
A primeira delas, porque algumas metas são relativamente desafiadoras para estados e municípios, no que se refere ao acesso à aprendizagem e à conclusão escolar, incluindo o fechamento da torneira do analfabetismo ‐ desafios ainda do século 20 que não foram devidamente resolvidos; possivelmente, alguns deles não serão sequer resolvidos pelos atuais Planos de Educação. Não sou otimista, por exemplo, quanto ao atingimento das metas vinculadas ao ensino médio ‐ de responsabilidade direta dos estados, em colaboração com a União ‐ no prazo estabelecido; nem quanto à alfabetização de nossas crianças, não obstante a criação do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (Pnaic) ‐ esta última de responsabilidade direta dos municípios, em colaboração com os estados e a União.
A razão do meu pessimismo deve‐se aos resultados, no mínimo, preocupantes obtidos nas duas áreas. O ensino médio está literalmente estagnado ‐ e num patamar muito baixo ‐ em termos de aprendizagem escolar, e com tendência recente de queda. Os resultados da alfabetização, por sua vez, não foram disponibilizados até aqui pelo Ministério da Educação. Sabemos, extraoficialmente, que não foram nada animadores, e talvez por isso não tenham sido divulgados para a sociedade.
Além disso, não se vê esforço para colocar em marcha o regime de colaboração, elemento absolutamente estratégico para a exequibilidade dos planos de educação nas três esferas de governo. Por exemplo, não se vê esforço para desenvolver um regime cooperativo entre municípios com base nos Arranjos de Desenvolvimento da Educação, conforme previsto no corpo da lei ‐ artigo 7º, parágrafo 7º ‐ do Plano Nacional de Educação. Na minha visão, isso seria estratégico para os municípios de maior vulnerabilidade social e econômica, podendo inclusive inspirar a implantação de planos regionais/intermunicipais de educação. Mas pouco se vê em termos de inovação. E nisso reside a minha segunda preocupação.
Enquanto ainda estamos tentando resolver a agenda do século 20, muitos países estão implementando com toda a força a agenda do século 21. Não estou me referindo àqueles tradicionalmente conhecidos, como Finlândia, Coreia do Sul, Cingapura, Japão e Canadá, mas de países que recentemente vêm fazendo um belo dever de casa no campo da educação, como Polônia e Vietnã. Este último viveu mais da metade do século 20 em guerras e conflitos. Apesar disso, na última avaliação do Pisa, ultrapassou no exame de ciências países como Estados Unidos, Alemanha e Reino Unido.
Enquanto ainda estamos tentando universalizar o acesso à educação infantil e ao ensino médio, alguns países estão a caminho da universalização do acesso às diferentes modalidades do pós‐médio. O último número da respeitável revista The Economist traz como capa o título “The whole world is going to university”. Traduzindo: “O mundo inteiro está indo para a universidade”.
Para resolver o problema educacional, o Brasil funciona como um espadachim que usa, simultaneamente, os dois braços para esgrimir: um deles na luta com os problemas do século 20; o outro tenta implementar a educação para o século 21. Para ajudar o nosso espadachim, precisamos dar caráter de urgência à educação, tratando‐a, de fato, como prioridade (não basta ser importante). Não só com mais recursos, mas também tomando as decisões e medidas necessárias para oferecer às nossas crianças e jovens uma escola pública de qualidade ‐ preparando‐os para enfrentar efetivamente os desafios impostos pelo século 21.
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